Sunday, October 23, 2005

Mulheres do Zimbábue sofrem com a crise econômica

Nada melhor do que estrear no projeto 42 com uma discussão polêmica. Eu como representante feminina deste não poderia deixar de postar algo que com certeza passaria desapercebido pelos companheiros da economia. O Zimbábue, país africano, cujo IDH ocupa o 130º lugar, está enfrentando uma grave crise econômica. Segundo a notícia publicada pelo portal terra nesta última sexta, as mulheres do Zimbábue estão sendo diretamente afetadas, pois está escasso um recurso de necessidade básica: o absorvente higiênico.

É um absurdo o que estas mulheres estão enfrentando. Ninguém está levando o assunto a sério e no Parlamento foi sugerido que se usasse peles de animais como um bem substituto para o absorvente. Não vivemos mais em uma era primitiva e apesar de a África ser um continente cuja maioria dos habitantes vive abaixo da linha de pobreza este tipo de problema não poderia existir.

Não há fabricas do produto no território nacional e por isso a população feminina tem acesso ao absorvente sul-africano de maneira ilegal. O que mais podemos esperar companheira Clara? Mercado negro de absorventes? O poder de compra destas mulheres é tão baixo que teriam que gastar metade do seu salário para comprar a quantidade necessária para o período menstrual. Temos um quadro de desequilíbrio no mercado de absorventes, com um excesso de demanda (que deveria ser inelástica) para uma oferta praticamente nula.

Qual a solução? Sindicalistas estão buscando financiamento internacional já que a moeda não é forte para buscar importações de outros países. Além da pobreza exacerbada, da fome, dos números assustadores de casos de Aids, o sexo feminino é forçado a vivenciar humilhações e correr riscos de infecções ao usar papéis e panos para sua higiene. Como diria o jornalista Boris Casoy: Isso é uma vergonha!



17 Comments:

Blogger Thomas H. Kang said...

Fantástica a iniciativa desse blog!
É terrível que existem economias do mundo como a do Zimbábue, que chega a esses extremos. Lamentavelmente, não tenho nenhum conhecimento sobre crises econômicas em países africanos. Está na hora de sabermos, porque são as que mais merecem preocupação.

Só uma pergunta, não pude ler todos os posts: que disciplina é essa aqui que o Prof. Shikida está ministrando?

Obrigado.
Thomas Kang, aluno do 6º semestre da UFRGS.

4:52 PM  
Anonymous Anonymous said...

Muito interessante este post, Camila! Aas vezes eh necessario uma noticia desse tipo para chamar a atencao para outros problemas e situacoes dramaticas criadas pela pobreza.

Nao sou especialista em absorventes higienicos. Nao sei quanto custam, nem quantos sao usados por dia, durante os periodos de menstruacao. Mas descobri que sabia menos ainda sobre o Zimbabue! Por isso passei um tempinho me informando sobre o pais. Recomendo os seguintes links:

http://www-wds.worldbank.org/servlet/WDSContentServer/WDSP/IB/2005/09/02/000012009_20050902090524/Rendered/PDF/315530corr1rev0pdf.pdf

http://www.mulheresnegras.org/zimbabue.html

Acho que aprendi coisas interessantes que possam nos ajudar a entender essa situacao.

O Zimbabue eh um dos paises do mundo com mais altas taxas de infeccao por HIV (20 a 25% da populacao entre 17 e 50 anos!). Tambem eh um local em que a principal base da economia, a producao agricola despencou como resultado de uma reforma agraria pessimamente planejada e executada. Isso provocou, tambem, a queda nas exportacoes e na producao industrial, retracao no investimento, aumentos de deficit publico e migracao para o exterior de boa parte da populacao mais qualificada profissionalmente. Em suma, parece que o Zimbabue, um pais que crescia aceleradamente logo apos sua independecia esta, agora, numa armadilha de pobreza.

Pra finalizar, gostaria de fazer um comentario sobre oferta e demanda. Nao ha desequilibrio no mercado de absorventes, no Zimbabue. Ha, como em qualquer outro mercado, um excesso de demanda a precos abaixo do preco de equilibrio. Eh um pouco diferente. O que explica precos tao altos? Enormes contracoes de oferta gerados pelos problemas economicos enfrentados no pais (basicamente criados por politicas governamentais equivocadas ou mal implementadas e acentuados por choques exogenos como secas e expansao da contaminacao por aids). Alem disso, embora absorventes higienicos tenham poucos substitutos proximos, sua demanda, ao preco de equilibrio no Zimbabue, nao pode ser considerada inelastica. Um dos motivos eh o fato que, como foi mencionado no post, absorventes higienicos custam, atualmente no Zimbabue, uma parcela consideravel da renda das camadas mais pobres da populacao (a maioria, infelizmente). Isso torna a demanda elastica ao preco de mercado.

Camila, parabens pela relevancia do post!

E Shikidao, parabens pela ideia e pela iniciativa!

12:59 AM  
Blogger Prof Shikida said...

Sergio,

valeu. Sergio é estudante do doutorado em economia da UCLA e acabou de me lembrar de algo: até esta demanda não é perfeitamenta preço-inelástica.

Zimbabwe (Zimbabue) acaba de me dar uma idéia: vender tudo o que tenho e abrir uma fábrica de absorventes lá.

Vou-me embora para o Zimbabue, lá sou amigo do rei. Terei o monopólio dos absorventes, com o preço que escolherei.

claudio

10:24 AM  
Blogger Prof Shikida said...

Este post provavelmente merecerá resposta. Acho que a Camilla gostou da idéia de continuar debatendo. O ponto do Sérgio (ou os dois pontos) me parecem: 1. o problema de excesso de demanda é diferente de non-existence da oferta. Acho que o problema é saber o que é, neste caso, a oferta.

O outro ponto, mas interessante, é o que se deriva das relações de elasticidades em modelos micro bem simples. O pessoal que fez matéria de micro deve se lembrar (ou deveria) das relações entre elasticidades-preço e renda num modelo, digamos, de preferências CES/Cobb-Douglas. A dica é o livro-texto de Henderson & Quandt.

10:31 AM  
Blogger Prof Shikida said...

mais dicas

http://news.google.com/url?sa=t&ct=us/0-0&fp=435fde67750b6abb&ei=snxfQ8eHGrnI6gH18vizDQ&url=http%3A//www.allheadlinenews.com/articles/7000646774&cid=0

e veja, Camilla, como o governo despiu as mulheres: http://www.sarpn.org.za/documents/d0000782/P871-GBW_March2004.pdf

Assim se incrementa um post.

Eis uma boa questão para discussão: "o não-acesso a um absorvente é uma falha de mercado ou uma falha de governo"?

Sugiro, fortemente (mas é só uma sugestão), que você ou algum outro aluno continue a discussão com a seriedade e cuidado que ela merece.

11:00 AM  
Blogger berman said...

Não quero falar bobeira, mas quem entra na chuva, vai acabar se molhando.

Penso que existem alguns bens cuja demanda é relativamente a mesma em um dado período de tempo. Uma mulher usa, na média, o mesmo número de absorventes em janeiro ou julho. Claro que existem alterações, mas pode-se esperar que a Maria vá comprar o mesmo número de absorventes em março ou novembro. No caso dos absorventes, o crescimento da demanda dependeria, ceteris paribus, do crescimento de número de mulheres na região que fazem uso de absorventes (crianças e mulheres na menopausa são contariam, uma vez que essas não costumam utilizar absorventes). Sendo que a demanda por absorventes muda pouco no curto prazo, a questão toda se reduziria à análise da oferta. Sobre a questão da elasticidade, acho que a demanda por absorventes é diferente entre as regiões. Como bem destacado pelo Sérgio, em países onde as renda é menor, a demanda pelo absorvente tende a ser mais preço-elástico do que em países com renda per capita maior, como a Europa.

No entanto, não sei se a análise “Oferta x Demanda” serviria para o caso em questão por uma simples razão: quando utilizamos esse instrumental, estamos partindo da hipótese que as instituições, se não perfeitas, são fortes e eficazes. Ou seja, partimos do pressuposto que a informação se dissipa de maneira razoável, que o governo é capaz de remediar as falhas de mercado, que a legislação protege a propriedade privada, que as leis funcionam como um mecanismo de incentivos ao empreendedorismo, etc. Penso que esse não é o caso do Zimbabwe. Não podemos esperar que, por faltar absorventes no país, algum empresário perceba a oportunidade de negócios e abra uma empresa para satisfazer a demanda. É muito mais complexo!

Sendo assim, o problema é antes do ambiente econômico onde se dá tal episódio, e não das forças do mercado. A mão invisível não consegue atuar em um ambiente onde há insegurança quanto a investimentos, direito de propriedade, informações consistentes, etc. Logo, analisar a questão do mercado de absorventes no Zimbabwe tendo em mente o equilíbrio não parece ser muito válido, uma vez que, levando em conta a típica economia de mercado, a África está mais pra lá do que pra cá. Podem ter certeza que o caso dos absorventes é apenas um entre vários mercados que enfrentam problemas na África...

5:08 PM  
Anonymous Anonymous said...

Philipe,

Nos, economistas, estamos sempre analisando demanda e oferta. O interessante eh que a analise funciona em qualquer situacao, quaisquer que sejam as instituicoes.

A existencia de oferta e demanda de mercado nao pressupoe liberdade de mercado. As propriedades de ambas eh que dependem das caracteristicas institucionais.

Acho que a expressao "preco de mercado" que usei no meu comentario acima esta sendo incorretamente interpretada como preco de livre mercado. Nao eh. Deve ser interpretada como preco de equilibrio do mercado.

Quanto aa questao da elasticidade, eu nao tive a intencao de comparar a elasticidade da demanda em diferentes paises. Meu objetivo foi lembrar que, normalmente, elasticidade varia ao longo de uma curva de demanda. Bens que respondem por uma parcela elevada da despesa individual tendem a ser elasticos (aos precos e quantidade de equilibrio - precos e quantidades aos quais oferta agregada cruza demanda agregada). Mesmo pequenas mudancas de preco podem mudar muito o custo de oportunidade de consumo de tais bens, fazendo com que a quantidade adquirida varie mais que proporcionalmente.

Segundo algumas estimativas, 70% da populacao do Zimbabue possui renda abaixo do nivel de pobreza. Para essas pessoas, o custo de absorventes higienicos eh, de acordo com a reportagem, muito alto relativamente aa renda. Portanto, para essas pessoas, faz sentido dizer que a demanda por absorventes eh relativamente elastica. Tambem faz sentido extender o raciocinio para a demanda agregada por absorventes higienicos, caso a renda percapita local seja muito baixa e o preco de (equilibrio do) mercado de absorventes higienicos seja muito alto em relacao a essa renda percapita.

Eh isso ai, abracos a todos!

Sergio

6:59 PM  
Blogger Prof Shikida said...

Eu entendi o ponto, Sergio. Mas a Camilla fez uma boa pergunta: e a oferta? Acho que você interpretou num sentido mais amplo (há possibilidade de contrabando), mas ela vê como: "não existe oferta porque a firma fechou".

E, claro, esta está sendo uma das discussões mais interessantes porque está trazendo a economia para seu nível mais básico (micro de oferta e demanda), além da qualidade dos argumentos (busque ler mais sobre o tema para que o próximo post seja melhor ainda).

Estou simplesmente extático (com x mesmo).

7:06 PM  
Blogger Prof Shikida said...

Organizando um pouco: Philipe partiu do ponto "mainstream-a" que é instituições-exógenas, para ser mais exato. Exemplo? Livro do Mankiw de introdução.

Sérgio usou um "mainstream-b", mais Alchian (UCLA!)-Demsetz-Barzel, assumindo a possibilidade de que instituições possam variar (eu diria quase que endógenas, mas não vou forçar a barra).

bom ponto para se pensar. Tá na origem da discussão de Douglass North, mas é da tradição de Alchian e Barzel.

Isto é importante porque especifica mais ainda nossa análise.

Sérgio, meu caro, bom comentário.

7:10 PM  
Anonymous Anonymous said...

Eu sei. Legal! Entao vamos la.

Nesse caso, acho que a Camila interpretou errado.

Entao ai vai minha interpretacao para a oferta, de modo a esclarecer para o pessoal o que eu tenho em mente: O ambiente institucional e os choques exogenos aumentaram o custo (de oportunidade) de colocar absorventes higienicos no mercado. Ou seja, a oferta deslocou para a esquerda. Ha oferta. Poderia ate ser o caso que esse deslocamento tivesse sido tao grande que a quantidade de equilibrio fosse zero. Mas nao eh, pois sabemos o preco, o que significa que houve compra e venda, seja no supermercado, na feirinha, ou nas maos de um contrabandista (isso nao vem ao caso). Quais foram os motivos dessa retracao de oferta? Nao sei ao certo, mas acho que a fuga de empreendedores e de capitais provocados pelas politicas economicas governamentais sejam uma boa pista.

7:22 PM  
Anonymous Anonymous said...

Como eh que voce chama mudancas nas regras do jogo? Acho que isso eh mudancas nas instituicoes, nao eh? Ou isso, ou imposicao de restricoes. O que voce me diz, Shikida? Voce eh quem entende melhor desses assuntos. Pode ser que eu esteja falando bobagem. Ou talvez eu tenha me referido a mudanca institucional quando deveria ter dito imposicao de restricoes. Da na mesma, nao da? Desde que voce nao esteja modelando, endogenamente, a mudanca no ambiente economico, nao eh? Ou nao? Agora to curioso!

2:17 AM  
Blogger Prof Shikida said...

é um pouco questão de grau. Quando se fala de um imposto novo, o pessoal não chama de mudança institucional. Mas quando muda o direito de propriedade sobre a terra, o pessoal chama. No fundo, ambos são choques.

É, se modelar a mudança aí a coisa fica bacana (complicada).

E vamos ver o que vem por aí da Camilla. Ela ainda deve o outro post da semana.

2:26 PM  
Anonymous Anonymous said...

Muito legal o tema, e a forma como voce o passou! Parabens Camilla! Conheçi apenas uma pessoa do Zimbabue que viaja muito e que ultimo lugar que ele quer ficar era lá, por ser um pais muito pobre. Porem, nao imaginava isso... Estamos de olhos fechados! A africa é esquecida em todos os sentidos, estudamos crises feudais, guerras americas, lemos livros de pensadores europeus, nos questianamos sobre a vida dos americanos, mas esquecemos da Africa... Porem, voce fez diferente, e nos chocou. Penso: o que poderia ser feito? como uma necessidade de higiene basica nao pode ser satisteita? por que o mundo fecha os olhos? Mais uma vez: Parabens!!!

3:39 PM  
Anonymous Anonymous said...

A Camilla como sempre inovando e trazendo comentários pertinentes!!Não sabia sobre o ocorrido, o texto me fez refletir e me indagar sobre essa injustiça social, econômica e cultural nesse mundo atual. Será que os países desenvolvidos não tem nada a ver com isso?

4:40 PM  
Blogger Prof Shikida said...

e o segundo post da semana tem de vir até sábado. não se esqueça.

9:38 AM  
Blogger Prof Shikida said...

meu ponto é simples, mas depende se você, Camila, sabe o que é "mainstream". Não? Aproveite que está aí na faculdade hoje e pergunte aos seus professores (ou, claro, use a internet com o cuidado que ela merece).

9:38 AM  
Anonymous Anonymous said...

Sugiro nos mobilizarmos para que este assunto seja mais divulgado em mídia nacional e internacional (fabricantes de absorventes de todo o mundo poderiam oferecer doações e quem sabe isto não mudaria o quadro?, como diz aquele velho ditado "de grão e grão é que a galinha enche o papo"). A maneira abordada foi bastante plausível e a idéia do projeto também...

4:10 PM  

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